Desenvolvimento de suicídio e integração social na visão de Émile Durkheim
2 - Suicídio e integração social na visão de Émile Durkheim
Numa visão global, para a maioria das pessoas, o acto de suicídio parecerá o mais individual dos actos, uma decisão que o indivíduo tomará no máximo desespero pessoal ou de depressão.
Uma das razões que levaram Durkheim a empreender este trabalho foi o intento de mostrar que o estudo dos comportamentos não é totalmente redutível ao estudo dos indivíduos.
O que Durkheim inicialmente fez foi recolher as estatísticas sobre o número de suicídios em vários países da Europa; durante o século XIX, e ali analisá-las. Verificou então um facto muito curioso. Se o suicídio fosse um acto puramente individual de desespero, em que não entrasse nenhuma componente social, dever-se-iam normalmente esperar variações apreciáveis de ano para ano nas taxas de suicídio, em qualquer sociedade. No entanto, apesar de os casos de suicídio serem em reduzido número, comparados com as, populações totais, as taxas de suicídio mantinham-se extraordinariamente regulares de ano para ano, e mesmo mais regulares que as taxas de natalidade e de mortalidade em determinados países.
Durkheim tomou em consideração todas as explicações de suicídios que tinham sido apresentadas até então, baseadas em factores como o clima, a raça, a doença mental, a hereditariedade e o contágio (neste sentido, convém chamar atenção no que diz respeito ao contágio o aspecto de que um suicídio provoca outro).
Tornou-se, no entanto, evidente que a frequência dos suicídios era maior em certos períodos do dia e em certas épocas do ano, nomeadamente a meio da manhã e a tarde e no verão mais que no Inverno.
Durkheim descobriu, posteriormente que a probabilidade do suicídio variava com a religião dos indivíduos. Na visão de Durkheim, ficou provada que os protestantes tinham mais probabilidades de cometer o suicídio que os católicos e os judeus eram os menos frequentemente levados a suicidar-se.
O suicídio também aparecia estatisticamente relacionada com o tipo de vida familiar: as pessoas casadas e com filhos tinham menor probabilidade de se suicidarem que as solteiras e as viúvas. Para as mulheres que eram ou tinham sido casadas, as que não tinham filhos suicidavam-se com maior frequência. Observou ainda que as taxas de suicídio eram reduzidas quando ocorriam acontecimentos políticos cruciais, como eleições importantes. Finalmente, consigo epigrafar que Émile Durkheim conseguiu encontrar um elo comum a todas estas relações: o grau de integração do individuo na sociedade. Neste sentido, pode-se concordar com Antífona quando afirma que “as taxas de suicídio pode estar a reflectir o facto de um número crescente de pessoas não se sentirem valorizados perante a sociedade”[1]. Nestas situações, leva-me a querer que o indivíduo que se sente rejeitado perante à sociedade, tende a enveredar pelo suicídio porque se acha inútil perante a mesma.
Assim sendo, Durkheim enunciou três proposições. A probabilidade do suicídio varia com o grau de integração religiosa, familiar e política. Quanto mais o indivíduo estiver integrado numa dessas esferas ou em todas elas, menor será a probabilidade de se suicidar.
A partir daqui Durkheim propôs a definição de um primeiro tipo de suicídio que designou de “ egoísta” e que seria causado por carência de integração social. (…)
Por outro lado, Durkheim chegou a outras duas conclusões de carácter geral: primeiro, o suicídio ocorria muito mais frequentemente nas cidades que nos campos, porque a vida na cidade era mais impessoal e anónima que a vida nos campos e que o processo de industrialização levada a cabo tinha por efeito aumentar a importância numérica relativa das populações urbanas. Com isto, é notório e sem medo de errar que, até certo ponto, a própria estrutura de integração social estava a ruir, de tal modo que os indivíduos enfrentavam cada vez mais dificuldades para se integrarem socialmente.
Durkheim, que estava muito preocupado com essa tendência (que julgava constituir um indicador de “mal social”, de patologia social), propôs a definição de um segundo tipo de suicídio – o suicídio “anómico” – derivado de situações em que o indivíduo não encontrava qualquer estrutura onde se pudesse integrar.
Verificou ainda que as pessoas se suicidavam em situações em que se registava um grau muito elevado de integração do indivíduo no grupo social (…). Concluiu, por isso, que em algumas situações sociais, o indivíduo podia estar tão profundamente integrado no seu grupo que acabava por atribuir menos valor à sua vida que à aceitação das exigências sociais a que se achava submetido. Deste modo, que por um “sentimento de honra”, quer por, “vergonha de transgredir” aquelas exigências, sacrificaria a sua vida para as manter ou mesmo reforçar.
Isto levou Durkheim a distinguir um terceiro tipo de suicídio, a que chamou “altruísta”. (…)
Desta feita, pode-se demonstrar que o acto individual de suicídio, muito embora isolado e raro, não pode ser adequadamente explicado sem se levarem em conta as relações sociais de que as pessoas, de uma maneira ou de outra, dependem.
“Convém notar que este tipo de metodologia não permite prever se determinado individuo se suicidará ou não, mas apenas identificar os grupos sociais onde os suicídios serão mais frequentes e as razões por que o serão”[2]. Assim sendo, pode-se compreender que qualquer acto social, por mais individual que pareça ser, é sempre influenciado pela realidade social em que se desenvolve.